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Aunque Rosalía de Castro, de quien hablamos el mes pasado, no viajó nunca a Portugal, su obra fue conocida en el país vecino ya en vida de la autora. Cantares gallegos formaba parte de la biblioteca de Antero de Quental, pero su mayor admirador pudo ser Eça de Queirós, una de las figuras esenciales de las letras portuguesas. Su propia hija le explicó al experto en la obra rosaliana Alberto Machado da Rosa que la escritora gallega había sido «una de las más profundas devociones literarias» de Eça, cuyos versos era capaz de recitar de memoria. Dos versos del poema Airiños, airiños aires se citan en una de sus novelas, A Capital: «Doces galleguiños aires, / quitadoiriños de penas».
Nacido en Povoa de Varzim en 1845, José Maria de Eça de Queiroz fue diplomático además de escritor y como tal vivió en La Habana, Newcastle, Bristol y París, ejerciendo como cónsul. O crime do Padre Amaro, O Mandarim, Os Maias o A ilustre casa de Ramires son algunas de sus novelas más destacadas, pero hoy quiero destacar otra, A cidade e as serras, que se publicó en 1901, un año después de su muerte. A cidade e as serras desarrolla una trama y un personaje antes presente en un cuento excepcional, Civilização. El protagonista, Jacinto, vive en la ciudad rodeado de lujos y de las más notables manifestaciones del progreso y la cultura, pero eso no le impide ser profundamente infeliz. Jacinto decide abandonar la ciudad para ir al campo, a las «serras» del título, un mundo más primitivo, apegado a los ritmos naturales. Entre el entusiasmo tecnológico y la fascinación bucólica hacia la naturaleza, Jacinto alcanza un punto de equilibrio. Y en ese equilibrio está presente la belleza y el misterio del firmamento nocturno:
«En la Ciudad (como notó Jacinto) nunca se ven, ni se recuerdan, los astros, por causa de los faroles de gas o de los globos de electricidad que los ofuscan. Por eso (como yo apunté) nunca se entra en esa comunión con el Universo que es la única gloria y el único consuelo de la Vida. Pero en la sierra, (…) un Jacinto, un Zé Fernandes, libres, bien cenados, fumando en el saliente de una ventana, miran las estrellas y las estrellas miran hacia ellos. (…) En este instante, otros Jacintos, otros Zés Fernandes, sentados en las ventanas de otras Tormes, contemplan el cielo nocturno y en él un pequeñito punto de luz, que es nuestra Tierra que tanto sublimamos. (…) Por tanto, todos nosotros, Habitantes de los Mundos, en las ventanas de nuestros caserones, más allá de los Saturnos, o aquí en nuestra pequeña Tierra, constantemente completamos un acto sacrosanto que nos penetra y nos une, que es sentir en el Pensamiento el núcleo común de nuestras modalidades, y así concebir por un momento, dentro de la Consciencia, la Unidad del Universo.»
Martin Pawley. Artigo publicado na sección «La noche es necesaria» da Revista Astronomía, nº 250, abril de 2020.
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Fragmento orixinal completo d'A cidade e as serras en portugués:
«Na Cidade (como notou Jacinto) nunca se olham, nem lembram os astros–por causa dos candeeiros de gás ou dos globos de electricidade que os ofuscam. Por isso (como eu notei) nunca se entra nessa comunhão com o Universo que é a única glória e única consolação da Vida. Mas na serra, sem prédios disformes de seis andares, sem a fumaraça que tapa Deus, sem os cuidados que como pedaços de chumbo puxam a alma para o pó rasteiro–um Jacinto, um Zé Fernandes, livres, bem jantados, fumando nos poiais de uma janela, olham para os astros e os astros olham para eles. Uns, certamente, com olhos de sublime imobilidade ou de sublime indiferença. Mas outros curiosamente, ansiosamente, com uma luz que acena, uma luz que chama, como se tentassem, de tão longe, revelar os seus segredos, ou de tão longe compreender os nossos…
–Oh Jacinto, que estrela é esta, aqui, tão viva, sobre o beiral do telhado?
–Não sei… E aquela, Zé Fernandes, além, por cima do pinheiral?
–Não sei.
Não sabíamos. Eu, por causa da espessa crosta de ignorância com que saí do ventre de Coimbra, minha Mãe espiritual. Ele, porque na sua Biblioteca possuía trezentos e oito tratados sobre Astronomia, e o Saber, assim acumulado, forma um monte que nunca se transpõe nem se desbasta. Mas que nos importava que aquele astro além se chamasse Sírio e aquele outro Aldebarã? Que lhes importava a eles que um de nós fosse Jacinto, outro Zé? Eles tão imensos, nós tão pequeninos, somos a obra da mesma Vontade. E todos, Uranos ou Lorenas de Noronha e Sande, constituímos modos diversos de um Ser único, e as nossas diversidades esparsas somam na mesma compacta Unidade. Moléculas do mesmo Todo, governadas pela mesma Lei, rolando para o mesmo Fim… Do astro ao homem, do homem à flor do trevo, da flor do trevo ao mar sonoro–tudo é o mesmo Corpo, onde circula, como um sangue, o mesmo Deus. E nenhum frémito de vida, por menor, passa numa fibra desse sublime Corpo, que se não repercuta em todas, até às mais humildes, até às que parecem inertes e invitais. Quando um Sol que não avisto, nunca avistarei, morre de inanição nas profundidades, esse esguio galho de limoeiro, em baixo na horta, sente um secreto arrepio de morte:–e, quando eu bato uma patada no soalho de Tormes, além o monstruoso Saturno estremece, e esse estremecimento percorre o inteiro Universo! Jacinto abateu rijamente a mão no rebordo da janela. Eu gritei:
–Acredita!… O sol tremeu.
E depois (como eu notei) devíamos considerar que, sobre cada um desses grãos de pó luminoso, existia uma criação, que incessantemente nasce, perece, renasce. Neste instante, outros Jacintos, outros Zés Fernandes, sentados às janelas doutras Tormes, contemplam o céu nocturno, e nele um pequenininho ponto de luz, que é a nossa possante Terra por nós tanto sublimada. Não terão todos esta nossa forma, bem frágil, bem desconfortável, e (a não ser no Apolo do Vaticano, na Vénus de Milo e talvez na Princesa, de Carman) singularmente feia e burlesca. Mas, horrendos ou de inefável beleza; colossais e de uma carne mais dura que o granito, ou leves como gazes e ondulando na luz, todos eles são seres pensantes e têm consciência da Vida–porque decerto cada Mundo possui o seu Descartes, ou já o nosso Descartes os percorreu a todos com o seu Método, a sua escura capa, a sua agudeza elegante, formulando a única certeza talvez certa, o grande Penso logo existo. Portanto todos nós, Habitantes dos Mundos, às janelas dos nossos casarões, além nos Saturnos, ou aqui na nossa Terrícula, constantemente perfazemos um acto sacrossanto que nos penetra e nos funde–que é sentirmos no Pensamento o núcleo comum das nossas modalidades, e portanto realizarmos um momento, dentro da Consciência, a Unidade do Universo!
–Hein, Jacinto?…”
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