Y las chimeneas decidieron escapar. |
—Conheces um rapaz de Pontevedra que está em Londres, que é modelo e que fijo umha curta?
Quem perguntava era Xurxo González. Era a primeira vez que sentia falar de Oliver Laxe. Tamém era a primeira vez que me encontrava com Xurxo, quem me chamara desde a Agência Audiovisual Galega, na que trabalhava com Manolo González, para conhecermo-nos despois de ter visto duas películas minhas, Como foi o conto (2004) e Os waslala (2005). A conversa deveu ter lugar em 2006, pois eu ainda nom rematara de montar a minha Bs. As. O interesse de Xurxo por mim, naquela altura, é indicativo do deserto cinematográfico que era a Galiza daqueles anos, ao tempo que demostra o incansável labor investigativo dos dous González desde a Agência.
E nom seria até moito despois que descobriria que Bs. As. tinha compartido secçom (Llendes) no Festival de Xixón de 2006 com Grrr! nº 7: ... Y las chimeneas decidieron escapar, a mencionada peça que Laxe realizara em Londres com Enrique Aguilar.
Pouco antes deste encontro Comba Campoy, Xis Costa e mais eu asseguráramos um pequeno e esporádico espaço para a crítica/propaganda cinematográfica em dous periódicos, A Nosa Terra e Novas da Galiza. A nossa idea era apoiar e divulgar desde essas tribunas o pouco cinema que se podia estar a fazer no país. Essa nom era mais que umha das patas do trespés ideal: produzir, projectar e promover. Significativamente o primeiro texto que saiu à luz, com vocaçom de manifesto, versava sobre a minha Como foi o conto (Maio 2005). A endogamia do processo era perdoável dada a inexistência doutras propostas. O espaço crítico nom ia acompanhado da produçom criativa. O carro antes das vacas. Deste jeito os nossos textos tivérom que limitar-se a falar do cinema de vanguarda internacional que às vezes se fazia visível na Galiza ou a criticar o patético panorama industrial galego.
Um dos escassos artigos que publicamos n’A Nosa Terra sobre cinema galego, novembro de 2008, foi “Passeios e Polifonias por Galiza”, sobre Paris #1 (Oliver Laxe, 2007). Despois da estrea de Todos vós sodes capitáns no Festival de Cannes de 2010 comecei a esboçar mentalmente um artigo sobre ela. Nesses momentos A Nosa Terra deixou de existir como semanário e o artigo nunca se materializou. Seis anos despois Laxe regressa a Cannes com Mimosas. É o momento de retomar aquel texto perdido na memória e enlaçá-lo coas impressons provocadas por esta última película.
Menciono o festival francês porque, desafortunadamente, neste curruncho da Europa só valoramos o próprio quando o próprio é valorado fora, premiamos às nossas e aos nossos cineastas só quando venhem premiados de fora ou, melhor dito, premiamo-los aqui por serem premiados aló, e nom polo valor intrínseco dumha obra que nos sentimos incapazes de qualificar. Umha década despois daquel primeiro artigo n’A Nosa Terra o cinema galego vive o seu melhor momento, a produçom é ampla, contínua e variada, a exibiçom na terra e a presença em festivais internacionais, prémios incluídos, está garantida... Mas falta umha das pernas do trespés: a literatura crítica. Agora parece que as vacas correm ceivas deixando o carro atrás. E a história do cinema galego no-la fam desde fora a golpe de comité de selecçom de festival e de prémios, mentres na casa seguimos sem poder artelhar umha valoraçom crítica das dúzias de películas de alta qualidade que a nossa gente produz cada ano. Todos nós deveríamos ser capitáns.
Todos vós sodes capitáns
Todos vós sodes capitáns (2010) relata as dificuldades que tem um professor europeu, chamado Oliver, para levar a cabo um projecto de película rodada co seu alunado, cativos em risco de exclussom social numha cidade marroquina. A metade de película o alunado, o professorado nativo e mesmo a sociedade inteira parecem confabular-se para derrocar ao cineasta foráneo, pero Oliver, como bom neocolonialista, é quem de levar a cabo o projecto valendo-se dum substituto nativo, um sipaio.
A película rodou-se em Tánger em 35mm. O preto e branco das images frustra a tentaçom do exotismo; ainda que bem é certo que o próprio contido (aula, rua, terraça, rostos de nenos...) afasta-se conscientemente do “orientalismo” romántico (a fim de contas estamos no Maghreb, é dizer, no “ocidente”). As únicas images a cor, incorporadas na coda da película, som aquelas rodadas em 16mm polos nenos protagonistas nos obradoiros impartidos por Laxe fora da ficçom. Realidade e ficçom misturam-se sem estridências na narraçom: um par de encontros casuais, que a primeira vista interpretamos como “reais” ou “documentais”, volvem-se ficçom tam pronto como a cena se repete com ligeiras variantes: as persoas documentadas convertem-se em personages, em actores que actuam.
Isto obriga-nos a estar em guarda contínua: um par de moços pedem-lhe a Oliver dinheiro ou um trabalho na rodage; está claro que esta situaçom, ainda que possível numha rodage real, está ficcionalizada. E um grupo de turistas, rodeados polas cámaras dos nenos, exclamam incómodos: “Deveriam pedir-nos permisso para filmar-nos!” Mas se somos testemunhas deste diálogo é porque a cámara de Laxe está a filmar o conjunto, e portanto devemos suspeitar que esse, tamém, é um diálogo escrito polo cineasta.
“Deveriam pedir-nos permisso para filmar-nos!” é umha frase carregada de significado que trai a primeira linha o tema do (neo)colonialismo e da romantizaçom do exotismo. Mas se é, como todo aponta, um texto escrito por Laxe, isso quer dizer que o director é moi consciente dos perigos dialécticos e interpretativos que conleva o feito de ser um artista europeu filmando em Marrocos. O turista prototípico caracteriza-se pola sua cámara, que utiliza sem rubor em todas as situaçons públicas e semi-privadas para capturar o “exótico”. Que seja um destes turistas o que se indigne quando o filmam nom deixa de ser sintomático das relaçons neocoloniais; mesmo poderia ser umha boa metáfora das desiguais relaçons económicas e de poder entre os países enriquecidos e os empobrecidos.
Shakib ben Omar en Suena la trompeta, ahora veo otra cara. |
A sentença da directora da escola é inequívoca: “Apartade-o deles!” Esta expulsom do projecto e da própria película dará passo á segunda parte do filme que, paradoxalmente, semelha-se mais ao cinema anterior de Laxe, é dizer, reflicte melhor, umha vez abandonada até certo ponto a ficçom, o cinema mais experimental, contemplativo e mesmo pastoril da sua obra anterior. Se na primeira parte as crianças nom entendiam a película que estavam a fazer porque carecia de argumento, porque “junta cenas... é como as notícias da tele” e “nom nos explica nada”, agora som eles os que desbotam a narraçom para filmar árvores, animais, cores, ruínas. Os rapazes semelham tomar o mando, parecem ser todos capitáns e amos do seu próprio destino, pero esse “todos vós sodes capitáns” é umha instruçom dada por Shakib para continuar coa ficçom, é a maneira que tem Oliver, ou Laxe, ou ambos, de realizar a película desejada. Oliver desaparece da pantalha para afiançar-se detrás da cámara como director: a segunda parte do filme, mais bucólica, menos narrativa, é mais sua. Laxe está mais presente na sua obra quando deixa de ocupar o lugar central na pantalha.
Shakib ben Omar en Todos vós sodes capitáns. |
Mimosas
Esta dicotomia, tanto no formal (película construída em dous blocos diferenciados) como no político, repete-se em Mimosas (2016). Mimosas, rodada em 16mm, apresenta-nos um xeque moribundo que pretende cruzar as montanhas para poder morrer e descansar na sua terra natal. Quando falece no meio do caminho a partida acompanhante divide-se entre os que querem continuar e levar o cadáver ao seu destino e os que decidem desandar o caminho. Paralelamente umha brigada de táxis atravessa o deserto fantasmagoricamente. O bufom Shakib (o mesmo Shakib de Todos vós...), apesar de nom ter grande experiência como condutor (essa é a queixa dos seus colegas), é seleccionado para ajudar à partida do xeque a chegar a bom porto. Milagrosamente (é dizer, sem maiores explicaçons) Shakib aparece no meio da montanha, disposto a unir-se aos peregrinos. A missom fracassa estrepitosamente.
O mercenário Ahmed tenta abandonar o cadáver. É nesse momento quando Mohammed, acompanhado da sua filha Ikram, decide acompanhá-los. Saïd, o companheiro de Ahmed, e mais Mohammed som assassinados por uns bandidos que seqüestram a Ikram. Finalmente Shakib e Ahmed, desde outro espaço e quiçá outro tempo, lançam-se ao resgate da rapaça.
Os portais entre ambos mundos ou blocos ficam escuros. Shakib aparece repentinamente na montanha; e Ahmed, ferido polos bandidos, esperta sob um táxi que o acaba de atropelar. Se a caravana de táxis polo deserto lembra o cinema de John Ford, as montanhas do Atlas, e os rostos desdentados dos bandidos, remitem às paisagem atemporais do cinema de Pasolini, co que comparte certo misticismo materialista e, por suposto, a sintaxe poética.
A indefiniçom temporal de Mimosas surge já na primeira image da película, mural dumha cidade pintado sobre umha parede. Quiçá se trate da cidade medieval de Sijilmasa, destino da peregrinaçom do xeque, que actualmente está em ruínas. Umha viage ao passado, já que logo. Umha impossibilidade (“transformar o destino”) que a fe e o amor (a inocência?) de Shakib pretende possível, nom sabemos se com éxito. Porque a narraçom é poética, ambígua, connotativa. Avondando no misticismo do relato e das personages, as tres partes nas que se divide a película levam por título as tres posturas do rezo: ergueita, inclinada e prostrada. Estes títulos capitulares, ademais de funcionar como estructuradores sintácticos, permitem as elipses e portanto apontoam a estética lacunária do texto. O mesmo título da película, nome dum local de Tánger que figurava numha versom anterior do guiom, nunca é explicado/explicitado, de jeito que é a imaginaçom do público a que tem que encher o oco, a que tem que criar ou recuperar esse enlace perdido entre nome e texto, entre um espaço-tempo e outro.
A aventura na ficçom como excusa para a aventura na realidade. Rodage de Mimosas. |
Paul Bowles e Ben Rivers
Mas essa consciência dialéctica entre um mundo e outro (Europa e África, realidade e ficçom), tam presente em Todos vós..., mais difícil de topar em Mimosas, fai acto de presença numha ramificaçom desta última assinada por Ben Rivers e chamada The Sky Trembles and the Earth is Afraid and the Two Eyes are not Brothers (2015). A primeira parte da película de Rivers documenta a rodage de Mimosas. Numha das primeiras cenas Laxe le a cámara o começo do relato de Paul Bowles “He of the Assembly” (1960), no que um home topa na rua um sobre co seu nome e co seguinte texto no seu interior: “O ceu treme e a terra tem medo e os dous olhos nom som irmaos”; diabólica frase que nom deixará de atormentá-lo. Despois, a imitaçom da narraçom de Mimosas, Laxe aparece num mundo paralelo, convertido em personage entre os taxistas dum mercado, conduzindo um carro ou tomando chá num terraço. Esta transformaçom de persoa em personage implica que as images anteriores, que até agora supúnhamos documentais, se volvem ficçom, ao tempo que desvelam a artificialidade de Mimosas, a falsidade de toda narraçom, o “como se fijo”: o cadáver do xeque é obviamente um boneco, o home que cai fai-no sobre umhas caixas de cartom devidamente preparadas... O que em Todos vós... fazia o próprio Laxe dentro da diégese da película (conversas aparentemente espontáneas que se repetiam para demostrar a sua artificialidade), aqui delega em Rivers. The Sky Trembles..., que ademais imita a estrutura em díptico das duas longas de Laxe, nom se entende se nom é em relaçom à obra do director galego.
Umha vez deixada atrás a rodage dentro de The Sky Trembles..., Laxe, como personage, é seqüestrado, torturado e, vestido cum traje de latas que nom abandonará, obrigado a bailar. Assi, feito escravo dançante, é vendido. Finalmente consegue escapar, correndo cara ao solpor, cara a Ocidente. Esta metáfora final está tamém presente no relato de Paul Bowles “A Distant Incident” (1945) no que se basea bastante literalmente a segunda parte da película: de Bowles toma o traje de latas, a mutilaçom da língua, os bailes e outros moitos detalhes.
Salvados polo Occidente. Plano final de The Sky Trembles...: Oliver Laxe corre cara ao solpor. |
A delicada posiçom de Paul Bowles como escritor estadounidense que viveu e escreveu em e sobre Marrocos é quando menos questionável, assi como a de Ben Rivers em tanto que adaptador/actualizador da sua literatura. A sua visom do seu país de acolhida (como a de Lawrence Durrell sobre Egipto) é produto da sua mentalidade neocolonialista, é projecçom do seu sentimento de superioridade e dos seus medos, é racismo disfarçado de cosmopolitismo. De resultas, oferece-nos um Marroco sujo, selvage e primitivo, ante o que a sua “civilizaçom” nom serve de escudo protector. Mostra-nos ao “árabe” como o “outro”, sem decatar-se de que realmente é el, ao igual que o Professor protagonista de “A Distant Episode” (relato que prepara o terreno para a novela A Sheltering Sky [1949]), o “outro”, o desconhecido, o que está fora de lugar, o que é incapaz de comunicar-se.
O británico Rivers entra em Marrocos disposto a fazer o seu relato e, que vímbios utiliza?: a rodage dum galego no Atlas e um par de relatos dum escritor estadounidense. A sua é umha visom externa que construe sobre uns alicerces externos. A visom de Oliver Laxe, quando menos, utiliza materiais narrativos, motivos e espiritualidades autóctonas.
Narrativas poéticas
Com Mimosas Oliver Laxe afiança-se com éxito no carreiro industrial do cinema; para ser mais preciso, no cinema de festivais, é dizer, narraçons de qualidade, mais ou menos poéticas, mais ou menos persoais, que loitam por topar um oco nas salas comerciais. Com Mimosas Oliver Laxe deixa de ser cineasta (experimental) para converter-se em director de cinema (narrativo); pasa do cinema puro ao dramático; ou, na terminologia de Germaine Dulac, abandona o cinema de excepçom para entrar no cinema comercial. Nom avondam na cinematografia galega propostas como a sua, um cinema narrativo livre e poético, um cinema de poesia na definiçom de Pasolini (quem, ignorante das propostas realmente poéticas do cinema experimental, limitava o seu campo de estudo às narrativas industriais), um cinema que se inspira nos clássicos narrativos mas nom renúncia à expressom persoal. Apenas topamos ficçons narrativas dentro do novo cinema galego porque a ficçom narrativa vai em contra da sua própria definiçom; porque as longametrages de ficçom precisam dum reparto e portanto dum aparato económico que o apoie, é dizer, dumha indústria. Mas algo hai: cara ao lado mais experimental temos obras como Arraianos (Eloy Enciso, 2012), O quinto evanxeo de Gaspar Hauser (Alberto Gracia, 2013), ou mesmo a minha A Pedra do Lobo (2010); na direcçom contrária, mais perto do cinema industrial convencional, estám A cicatriz branca (Margarita Ledo, 2013) ou as narrativas de Mario Iglesias. O resto da ficçom galega está tam anquilosada em fórmulas académicas trilhadas, falhidas e prosaicas, em cópias barateiras de produtos comerciais que nom buscam um público de persoas senom de consumidores/clientes, que obras poéticas como Mimosas representam umha bemvida e necessária lufada de ar fresco.
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